sexta-feira, 17 de junho de 2011

Quem quer voltar a ser criança põe o dedo aqui!


Leia Mateus 18.1-6
Quem de vocês, adultos, gostaria de voltar a ser criança? Ah, como seria divertido poder correr com os pés descalços pela rua novamente... jogar bola com a garotada e brincar de casinha com a tia-meia-irmã! Fazer arte das boas e depois pedir à Deus para que ninguém descubra – e de vez em quando ser atendido. Pensando assim, a proposta de Jesus parece tentadora! Voltar a ser criança? Sem dúvidas!

Mas... Como acontece com todo desejo, convém tomar cuidado. Afinal, você sabe como viviam as crianças na época de Jesus? Qual era o seu lugar na sociedade? Se elas faziam parte da comunidade de fé?

Ser criança no primeiro século não era fácil. Em primeiro lugar o bebê deveria nascer de acordo com o sexo desejado por seu pai; não poderia apresentar qualquer problema físico além de aparentar boa saúde. Se uma dessas condições não fosse atendida, o bebê seria jogado fora em um lixão conhecido por Sheol (em hebraico) ou Geena (em grego). É importante notar que estas palavras, na Bíblia, são comumente traduzidas por “Inferno”. Portanto, os pais da criança atiravam-na no “inferno” sem nenhum remorso!

Se por acaso esta criança sobrevivesse, a sua vida não ficaria mais fácil. Isto porque, para o povo judeu, a criança era impura. Isto porque elas brincam no chão, levam qualquer coisa à boca... Saber se ela estava pura ou impura era praticamente impossível. Por isso convencionou-se que a criança está sempre impura. Sendo impura, a criança estava excluída da vida religiosa, do contato com a sociedade adulta. Esta exclusão e desqualificação da criança, no entanto, não é privilégio dos judeus. Muitas outras culturas até hoje acreditam que crianças não alma. Você acredita nisso? Para estes povos a criança é um ser-humano de segunda classe, sem direitos, sem voz, sem vida.  Então eu pergunto de novo: Quem quer voltar a ser criança?

Talvez você aí no seu banco esteja pensando: “mas isso foi a mais de dois mil anos atrás e coisas assim não acontecem hoje”. Ou pelo contrário, você pode ter percebido que as coisas não mudaram muito.

A criança é um ser humano racional que é privado do seu espaço na sociedade. Na família é tratada quase como um bichinho de estimação: Deve obedecer em troca de alimento, teto e carinho. Na Igreja, não deixam que ela se aproxime do altar... Ou então são separadas da comunidade e dos seus pais só porque o Ministério de Música não quer tocar as músicas que elas gostam ou porque o pastor não teve paciência para preparar um sermão que use de palavras que estejam próximas do vocabulário infantil. Enquanto isso, nos noticiários da TV, assistimos horrorizados casos de crianças que, assim como no primeiro século, são jogadas no lixo; tão novinhas, esses brotos de vida experimentam o inferno!

É... Ainda não é fácil ser criança neste mundo. No entanto Jesus impõe a condição de ser humilde tal qual uma criança. Humildade aqui não se trata do oposto de um comportamento ufanista; ser humilde não é o contrário de ser “metido”. Segundo as palavras escritas no livro de Mateus, humildade aqui se refere a compartilhar desta mesma condição de penúria. Em outras palavras, é preciso que se sinta na pele a situação de penúria pela qual passa uma criança afim de que se participe do Reino de Deus.

Esta condição imposta por Jesus é desafiadora! O Filho de Deus não está, de modo algum, insinuando que é preciso sofrer, mas sim que o nosso sofrimento possa ser agente de transformação na vida daquelas e daqueles que compartilham desta condição de penúria. Por isso o “tornar-se humilde” é uma exigência profética. Ela exige de cada cristã e cristão que se ocupe em construir um mundo melhor. Um mundo que seja amigável à toda a criação e principalmente às indefesas crianças. Um mundo que não as impeça de ter voz na família... Um mundo em que as Igrejas e seus altares também sejam ornamentados com brinquedos de toda sorte; que o sermão possa ser como o conselho da mamãe ou como a história do papai; que as nossas Igrejas, além de apresentar os primeiros passos do Evangelho, possa nos apresentar um Cristianismo criativo, tão diferente da mediocridade reinante no mundo... Um mundo onde as crianças não são jogadas em lixões ou em rios, mas que são embaladas pelo colo de seu pai e mãe e também no colo de Cristo.

É um sonho bonito. Parece até desenho de criança – com casinha, árvore e família de mão dada. Mas talvez seja justamente esta a questão. Porque, enquanto nós estamos vindo todo domingo na Igreja, esperando aprender como chegar no Reino de Deus, as crianças já estão lá. Acho que podemos aprender um pouco mais com elas! Só é preciso deixar que elas se aproximem de nós, do nosso mundo.

Que Jesus Cristo, que nos afaga em seu colo com tanto afeto, nos ajude a estar atento para a criança que puxa a barra de nossa roupa.

Sermão pregado em 8 de maio de 2011, por ocasião do batismo do meu irmão Wesley de Almeida Basílio.
A liturgia do referido batismo está disponível aqui

Imagem disponível em: http://www.cruzadadomenor.org.br/shared/atuacao_criancas.jpg

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