segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

A família sagrada


E, tendo eles [os Reis Magos] se retirado, eis que o anjo do Senhor apareceu a José em sonhos, dizendo: Levanta-te, e toma o menino e sua mãe, e foge para o Egito, e demora-te lá até que eu te diga; porque Herodes há de procurar o menino para o matar.
Mateus 2. 13
Quando leio os primeiros capítulos do livro de Mateus, fico pensando na família de Jesus. Eles enfrentaram tantas dificuldades familiares e pessoais que parece um milagre terem continuado juntos. A gravidez precoce de Maria certamente foi um problema para José. As verdadeiras jornadas empreendidas por José até Belém e até o Egito foram um desafio para a Maria grávida e para a Maria lactante. A incapacidade de prover à esposa um lugar digno para que pudesse dar a luz, também pode ter sido uma afronta ao Homem de família chamado José. Mesmo assim essa família nunca se desfez. Qual o segredo? Lendo a história da sagrada família, identifiquei três pontos que gostaria de compartilhar com você

Foram sinceros e honestos uns com os outros.
Não era certo que uma noiva estivesse grávida. E menos certo era que o pai da criança não fosse o noivo. Isso era caso para escândalo e fofocas entre as famílias. Se isso fosse a público, Maria ficaria falada pelo resto de sua vida. Porém a atitude de José foi outra. Ele guardou para si o que sabia e tentou deixá-la secretamente (afinal ela o havia traído!).
A passionalidade às vezes cega a nossa razão e o teor dos desentendimentos são levados a público como forma de retribuir a dor sentida na pele. Discussões são inevitáveis, dada a diferença entre egos. Mas a agressão, principalmente a pública, mina os sentimentos, tornando até a relação de amizade impossível. As faíscas também atingem aos filhos e os traumas permanecem por toda a vida. E é triste ver os filhos casados repetindo os mesmos erros dos pais.
Quando se é sincero e honesto, os grandes e pequenos detalhes não se acumulam e nunca vão resultar em trovoadas por conta de um sapato virado ou uma toalha molhada. As inevitáveis discussões – sejam por assuntos banais ou mais sérios – perdem o seu poder de destruição e tornam-se um instrumento importantíssimo para o crescimento do casal. Afinal, os desentendimentos podem ser uma oportunidade de conhecer e aprender o outro. Se estamos sendo sinceros, dificilmente entramos numa “briga” para matar ou morrer, mas sim para buscar um consenso que atenda os dois lados.

Sempre estiveram juntos.
Onde quer que Deus os enviassem, os três – e futuramente os irmãos e irmãs – estavam sempre juntos. Maria e José viajaram no deserto, estando Maria grávida de nove meses. Quando foi preciso, Maria e José viajaram também para o Egito, sendo Jesus uma pequena e frágil criança de colo. Quando Jesus foi resgatado no templo, José e Maria também estavam com ele – ainda que o tenham perdido. Naquela festa onde Jesus operou o primeiro milagre, Maria estava lá, palpitando. Quando Jesus estava na Cruz, lá em baixo chorava Maria.
Para a família, o antônimo de “estar juntos”, pode remeter a palavra divórcio. Sobre este tema, a única certeza que temos é que não podemos analisar a questão do divórcio, impondo-lhe um padrão único. Cada caso é um caso. E às vezes, por mais dolorido que isso seja e por mais estragos que venha produzir nas pessoas envolvidas, o divórcio até é aconselhável. O problema é que nos dias de hoje, com a sua popularização, o divórcio tem sido a primeira, e não a última alternativa
Não apenas o divórcio, mas a distância tem sido outra forma de separar e enfraquecer as famílias. Chega um momento em que os pais precisam abrir a porta da casa para os filhos e lhes dar um empurrão para fora. Seja para fazer faculdade ou para atender a ânsia de liberdade presente no coração jovem. Mas até aqui existe uma linha que une os corações dos familiares. Essas linhas são formadas pelas lembranças eternizadas na memória, o sotaque, as manias, o caráter, a visão de mundo, o comportamento moral entre tantas outras coisas que ajudam a formar a identidade e a mantê-la quando a distância se coloca entre aqueles que amamos. O que nos leva a dizer que os pais precisam aprender a deixar seus filhos irem e os filhos precisam aprender a ir e ao mesmo tempo, permanecer. Como diz um personagem de Tolkien: Lá e de volta outra vez. A união de coração e não apenas de corpos é vital para que a família prospere.

Fizeram a vontade de Deus.
A vida nos oferece várias escolhas. Algumas são ficar ou partir, dar ou receber, aceitar ou recusar. Com a nossa visão limitada, escolhemos a parte que nos parece mais promissora, sem se preocupar se seria aquela a vontade de Deus. Escolhas precipitadas, invariavelmente só provocam dor, sofrimento e arrependimento. Nessas situações Deus ficou longe, já que nós o excluímos do processo. E ainda que tentemos concertar os erros, o tempo que se perdeu e as suas conseqüências serão irrecuperáveis.
O homem da Sagrada Família nos dá outro exemplo. José era servo do Senhor, disso não há dúvida. A Bíblia não deixa claro qual foi a linha que ele, ou Maria, se identificavam. Se eram Zelotes, Fariseus, Saduceus, ou se iam à Igreja todos os domingos, não se sabe. O Que se sabe é que quando Deus veio em sonhos falar a José, ele foi atento. Ele não se desesperou nem se precipitou. Simplesmente ouviu todo o recado que o Anjo lhe transmitira e fez segundo a vontade de Deus. Este talvez seja o principal de todos os pontos. Fazer a vontade de Deus é conhecer a sua sagrada escritura e aplicar a sua mensagem às nossas vidas.

Um último detalhe que gostaria de abordar é o que queremos dizer quando falamos de família. Se o meu grego não está muito enferrujado, a palavra família deriva da palavra oikos, a mesma que dá origem a outras palavras como oikoumene, que por sua vez dá origem à palavra ecumenismo e quer dizer “todo o mundo habitado/civilizado”. Caminhando por essa lógica, a família não está restrita a apenas os nossos parentes consangüíneos ou adotados. Há um comercial de salsicha que fala sobre as várias famílias que temos. Eles estão certos! A família acontece quando estamos juntos, entre amigos, sorrindo ou chorando. Ela acontece no nosso ambiente de trabalho, acontece nos sindicatos, quando nos unimos para brigar em prol dos interesses da família proletária. É uma família que cresce até quando um bêbado chato se junta à nossa roda de violão na praça. E dessa família devemos cuidar com o mesmo apreço que cuidamos daquela com que dividimos a nossa casa.

A família de Jesus, assim como a nossa, é como uma grande parede de tijolos. Ainda que aquele assentado na base, segurando a casa no chão, esteja bem distante do que está na cumeeira da casa, suportando o telhado, há uma só massa que os une: O amor e a devoção em seguir, em família, a vontade de Deus.

Que o filho Jesus nos abençoe.


Imagem: http://comsantateresa.org.br/website/images/fotos/figuras/sagrada_familia-770661.jpg

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