terça-feira, 19 de outubro de 2010

O Cristo da Guerra


Se perguntassem como Jesus Cristo era, acho que vocês o descreveriam como alguém sereno, sábio, tranqüilo. Um homem que ajudava as pessoas que encontrava pelo caminho e que em suas atitudes fazia jus ao título de “Príncipe da paz”. Bom, foi isso que a minha professorinha da escola dominical me ensinou a [não] muito tempo atrás. Mas se Jesus é mesmo este homem da paz, o que faremos com o texto lido hoje? Afinal, é o próprio Jesus que está dizendo não ter vindo para trazer a paz!
Diante desta “possível” contradição, acho importante ser honesto com o texto e lê-lo a partir do seu contexto procurando entender o que Jesus Cristo quis dizer com “PAZ” e “Divisão”.

Afinal, que paz é esta que Jesus  não trouxe?
Nos dias de Jesus havia um conceito de paz muito peculiar: A PAX Romana. Essa tal “paz” romana era imposta através da pobreza. Havia um esquema de cobrança de impostos que extorquia até o último Denário do trabalhador. Era um esquema corrupto, onde cada esfera de poder desviava mais dinheiro para si. O Rico ficava mais rico e o pobre, se não morresse antes, ficava mais pobre. A PAX Romana também era imposta através do medo. Nas ruas e esquinas de cada cidade conquistada havia uma guarda romana pronta para abafar qualquer sinal de revolução. As legiões romanas eram temidas onde quer que seu nome fosse pronunciado. Com medo da morte, as pessoas simplesmente não reagiam; a vontade do imperador era cumprida: Assim, tudo estaria em paz.
Apesar dos mais de 2000 anos que dividem o Novo Testamento de nós, parece que os métodos não mudaram muito.

Muitas pessoas sentem-se mais seguras com uma polícia que, ao invés de aplicar as leis, agride até sangrar a tudo e a todos. Estas mesmas pessoas aplaudem quando os Estados Unidos fazem chorar as mães americanas e as mães palestinas que tem os seus filhos roubados por uma guerra sem sentido. Uma guerra motivada pelo medo de bombas que até hoje não foram encontradas. Estas mesmas pessoas, quando abordadas por um pedinte, culpam o sistema – afinal, os pobres precisam existir para o bem do mercado; ou então jogam a culpa no Governo pela situação calamitosa destes nossos irmãos e irmãs. E então essas pessoas sentem paz.

Quando Jesus diz que não veio trazer a paz – esta paz – ele queria dizer que nós, os seus discípulos, não deveríamos ser promotores deste tipo de paz. Assim como Jesus, o cristão e a cristã não devem ser incentivadores deste tipo de paz que trilha o caminho da morte. O grande problema é que quando nos sentamos nos bancos da Igreja ou estamos no conforto da nossa casa agradecendo pela distância que há entre nós e a guerra, entre nós e as ruas estamos também promovendo este tipo de paz maldita.

Como devemos reagir? Como deveria ser a reação do cristão em relação a esta paz? Talvez a resposta esteja na divisão que Jesus está propondo.
É muito interessante perceber que a divisão da qual Jesus fala acontece no ambiente familiar. De imediato, isto diz para nós que a divisão proposta por Jesus não causa mortes. Além do assassinato de um familiar ser algo impensável, para a sociedade daquela época o assassinato de um familiar abalaria toda a estrutura familiar, prejudicando o sustento da casa. Matar um parente é  o mesmo que cometer suicídio. Além da ausência de mortes, a divisão que Jesus está propondo é subversiva na medida em que contesta as estruturas básicas de poder. O filho passa a contestar o poder do pai, a filha a autoridade da mãe e a nora a autoridade da sogra.

Ao longo da história, homens e mulheres tem se empenhado em seguir este ensinamento de Jesus. Motivadas pela compreensão de que todo o mundo é obra das mãos de Deus, e portanto nosso irmão, parte da mesma família, tais pessoas tem subvertido a ordem aparentemente natural das coisas sem derramar uma gota de sangue. Pessoas conhecidas como o rev. Luther King que lutou pela garantia dos direitos humanos aos cidadãos negros dos Estados Unidos; ou pessoas anônimas que tem dedicado a sua vida para ajudar aquelas que tiveram o seu direito à terra, à saúde, à moradia e tantos outros negados. Trata-se de um protesto silencioso, de uma guerra da não-violência contra as potestades dominadoras do mal.

Hoje somos convidados a mais uma vez nos converter. A converter para o Cristo subversivo, ao Cristo militante e engrossar essas fileiras; a ser mais um dentre os conhecidos ou anônimos que vêem a figura de Cristo jogada na sarjeta, agonizando nas filas dos hospitais ou explodindo com bombas e armas. E mais que isso: Lutar para que esta realidade seja transformada pela verdadeira paz.
Como podemos protestar? Como podemos ser agentes da divisão, da subversão? Existem várias organizações que batalham pelo estabelecimento do Reinado de Deus. Nossa AMAS, com certeza, é uma dessas organizações. Mas dado o momento histórico que vivemos, gostaria de chamar atenção para uma forma de protesto silenciosa e que tem sido utilizada de forma muito inconseqüente  pelos brasileiros e especialmente pelos cristãos: O voto. O voto do cristão não deve ser orientado pelo mau-caratismo de alguns pastores que dizem  “vote neste e não naquele”. Tão pouco o nosso voto deve ser para aquele candidato que atende os nossos interesses particulares ou baseado em boataria viralizada pela internet. O cristão e a cristã que vota consciente, analisa a plataforma de governo dos candidatos e escolhe aquela que realmente pode promover a justiça social, que favorece aos necessitados e que cuida da criação de Deus, promovendo a vida.

Concluir esta mensagem é difícil. Principalmente porque os desafios que nos são impostos são grandes! Com a sua palavra, Jesus está nos convidando a romper com esta paz de aparências e a subverter o sistema. Em outras palavras, o convite que Jesus nos faz hoje é para, através de pequenas ações e de protestos não-violentos, mudar o mundo!

Como povo de Deus é impossível que continuemos a concordar com uma paz que só é aquecida pelo cano quente de uma metralhadora. É inadmissível que o brilho dos nossos olhos continue a ser o reflexo das bombas que explodiram no noticiário. Não podemos permitir que nossas mãos continuem sendo manchadas com o sangue dos nossos irmãos e irmãs que morrem nas filas dos hospitais, em clínicas de aborto clandestinas ou nas ruas e nas praças da nossa cidade. Como Jesus, não é esta a paz que vamos querer. Mas é a paz que vamos subverter.

Que Cristo conserve no nosso coração a esperança de um dia ver o mundo ressurgir em paz, a verdadeira paz de Cristo.

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